E Paris sempre acabou por acontecer. Desta vez voámos bem cedo, voámos TAP e tudo correu sobre asas.
Voltar a Paris foi uma sensação de regresso a casa. Preciso dos dedos das mãos e os dos pés para contar as vezes que já lá fui. E isto tem tanto de bom como de trágico. Será que nunca vou concretizar o meu sonho de viver de forma assumidamente boémia  durante um mês inteiro na Cidade Luz?
Tenho esta ideia tão real na minha cabeça que me parece que está sempre a meses de acontecer. Acordar, ir comprar um café e bebê-lo lentamente numa esplanada enquanto folheio uma revista e finjo ler 3 páginas do romance que comecei a ler e sei que não vou acabar.

Ao longo dos dias, dos meses, da vida, dou comigo, agora, a ter mais vontade de ficar do que de ir. Com a morte da Eva no outono e do nosso gato do quintal no início de janeiro, dou comigo numa carência emocional só tranquilizada com a presença da Bailey e dentro destas quatro (vá, a casa não é assim tão pequena) paredes. Sofro imensamente de ansiedade de separação dela numa pequena ida ao médico. Estou refém da minha própria vida. E, por mais dramático que possa parecer, é a verdade. De onde vem esta minha carência tão peculiar?

2023 está a ser muito duro. Está a ser, por motivos vários, um ano completamente atípico e desmotivador. Bem sei que é o nosso cérebro que comanda a guerra, mas há batalhas impossíveis de vencer. E o problema está também em assumir que este ano é uma guerra. Mas que mania de pensar tudo em demasia. Fui tão feliz durante as primeiras 24 horas em Paris! Era uma criança na feira popular, de carrossel em carrossel com doces nos bolsos e um sorriso rasgado de cansaço e vivência fervorosa. E nos dias seguintes o céu cinzento caiu sobre mim. Um não estar bem em lugar algum, um precisar de algo que não se sabe bem o que é, parece que estamos quase a decifrar, mas não, não é isso. Não é também isso.

Uma coisa boa trouxe de Paris: roupa. Ah!! Como é bom ter um escape tão original… sou um cliché. Podem fazer-me companhia, podemos beber um bom vinho branco enquanto falamos de música, de horóscopos e da vida. Posso queixar-me e fingir que é tudo fruto de um vida privilegiada. Mas a mente não funciona assim. Não é por não ter passado fome, e ter tido uma família (singular) mas família, que faz de mim uma pessoa que obrigatoriamente deveria ser grata e bem resolvida.

Sinto que aos 41 já vivi 20 vidas. E em todas elas fui a mesma e fui diferente. Talvez eu seja mesmo uma alma velha; já ando cá há muito tempo e carrego em mim dores e alegrias que não se me cabem por vezes no corpo.

Mas o texto era sobre Paris… sempre acabou por acontecer! Levei o Hugo à campa do Jim Morrison. Trepámos a cerca, cantámos, chorámos e agradecemos ao Poeta tudo o que nos ensinou. Somos e seremos sempre cavaleiros na tempestade e vamos sempre acender o fogo na rua do amor ou num barco de cristal. Isto foram tudo referências a canções dos The Doors; se não perceberam, eu fico triste, mas desculpo-vos. Sou louca, mas em mim habita a graça salvadora da fé na humanidade.

Vou transformar a minha dor em qualquer coisa que não isto. Vou fechar o computador e tocar o chão e a relva. Sentir o sol queimar-me a pele enquanto fecho os olhos porque sei que me vou esquecer de levar os óculos de sol. Ironicamente, voltaria a Paris sem hesitar, mesmo com o céu cinzento. Talvez, também, ainda haja alguma fé em mim.

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