Não sei se todos tiveram alguém assim no seu percurso escolar. A pessoa de que vos falo era tão presente e tinha tanto carinho nos seus gestos, que estes se perpetuaram para todo o sempre. Hoje falamos da minha professora de Português e directora de turma do 10.º ao 12.º anos.

Querida professorinha, como eu gosto tanto de si! Não me lembro se foi automático, ou foi crescendo com o passar dos primeiros dias, mas sei que em inícios do primeiro mês, eu já tinha alcunha, direito a colo e olhares maternais de reprovação ou consentimento.

Existem mesmo pessoas que nasceram para determinada profissão. A paixão com que nos ensinava cada autor era exímia. A paixão com que nos lia textos, poemas e nos encorajava a sermos nós, bons, mas nós, ficou comigo ad aeternum.
Lembro-me de episódios específicos com a clareza que não me lembro de coisas que acabaram de acontecer. Lembro-me de toda a introdução a Fernando Pessoa, da preparação de algo que nos iria mudar. Eu já amava e conhecia, e então a professora, de peito cheio, disse: o primeiro poema vai ser lido pela Joana Seixo. E lá rematei eu o primeiro poema “Sentir? Sinta quem lê!” Que momento bonito, quando a poesia nos une, nos move e nos transforma.

O Português era com toda a certeza a minha disciplina preferida, mas sei bem que uma professora faz metade desse amor; meio caminho dele foi-me dado por ter tido a melhor de todas. Cândida Ramalho. Acreditam que uma vez, durante a aula, deu um murro seco na sua mesa e disse ALTO: na vida, sejam loucos! E eu fui.

Um pormenor interessante é também a história com o Hugo. O Hugo era da minha turma, passávamos diariamente bilhetinhos um ao outro porque as nossas carteiras eram muito próximas entre si. Esta brincadeira começou com ele a meter-se comigo e ao fim de 3 anos são centenas os bilhetes que guardei. Guardei todos os que me escreveu. O Hugo, obviamente, com o seu orgulho rebelde de um jovem insubordinado, deitou fora os meus. Hoje vejo tristeza na sua opção enquanto lhe esfrego na cara os meus e lhos recito até ele corar.

Estes bilhetes não eram indiferentes ao olhar da professora Cândida, mas ela fingia não os ver. E quando era muito óbvio, fechava os olhos e sorria. É que a professorinha era defensora da ideia de que eu e o Hugo éramos feitos um para o outro (a ironia da vida, agora juntos aos 40). Já no 10.º ano nos dizia que devíamos namorar, mas eu namorava com outro e só tinha olhos para ele. Contudo, no 11.º algo mudou. Passei a ver o Hugo de outra forma, o seu ar um bocado snobe já não me irritava, já me despertava curiosidade e até vontade de o contrariar. No 11.º namorámos e como a professora Cândida ficou feliz!

Anos mais tarde, já andava eu na universidade, ia lanchar com a professora e falar sobre a vida, o tempo, o universo… Quase sempre lhe saiam estas palavras da boca: “Então e o Hugo? Gostava tanto de vos ver juntos…”

Pois bem, querida segunda mãe (sempre o foi), estamos noivos e eu sei que foi obra sua e de todos os anjos que consigo planearam esta malandragem.

O meu coração palpita de amor por si. Hoje, já não estando entre nós, tenho fotografias, conversas guardadas e memórias eternas que vivem comigo. “Num mundo que se faz deserto, temos sede de encontrar um amigo” e eu encontrei um verdadeiro.

Saudades infinitas. Já lhe disse que sou feliz? Pronto, eu sei que sabe.

Sempre sua, Joana.

Ilustração Uva Uviedo

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