Sempre quis criar um clube de leitura, mas nunca tive a disciplina necessária para me comprometer. Esta explicação é, no mínimo, estranha, especialmente vinda de mim, um ser regrado e pragmático.

A escolha do primeiro livro foi fácil. Descobri o Jordan B. Peterson em dezembro, nos shorts do youtube. Depois li um artigo sobre o mesmo no jornal O Observador e, automaticamente, dei comigo a comprar o livro, meio a dormir, já de luz apagada, num ritual de compras online que se amplificou bastante desde que saí da cidade.

Quando anunciei no Instagram o livro do mês, o apoio foi enorme; claramente, ando a nadar na maionese e desconhecia o Peterson por completo. Mas com esse apoio, veio também uma onda de comentários e mensagens privadas de desaprovação e ira por razões que eu desconhecia. Fiquei esclarecida com algumas, outras passaram-me ao lado e, na maioria, não as li. Não li, como? Abro a DM, leio as primeiras palavras e elimino. Não há espaço para ódio, especialmente quando este vem de um lugar narcisista de pensamentos radicais e opressores da liberdade de expressão. É fácil: não gostam, não leiam.

Dito isto, não sigo o autor nas redes sociais, não vou falar sobre ele, mas sim sobre este seu êxito de vendas, 12 regras para a vida.

Psicólogo clínico, erudito e extremamente polémico. Introdução feita. Gostei muito de ler este livro. Sinto que aprendi, analisei-me, chorei, ri… foi uma verdadeira aventura nas entranhas da humanidade. Das 12 regras, as que mais gostei foram as seguintes:

Regra 5: Não deixe os seus filhos fazerem coisas que o levem a não gostar deles

Regra 8: Diga a verdade – ou, pelo menos, não minta

Regra 11: Não incomode as crianças quando estão a andar de skate

Todas as regras tiveram impacto; apenas, estas foram as que mais fizeram ressonância com o meu ser.
Posso afirmar que a maneira de pensar do autor está alinhada com a minha em 70%. Faço terapia desde criança, por isso, muitas das transformações interiores que alcançamos com esta leitura, eu já as havia alcançado por força do destino (e da minha natureza refratária).

“Temos de falar, de ir a algum lado e de fazer coisas para nos motivarmos. Caso contrário, permanecemos incompletos, e a vida é muito difícil para alguém incompleto”. Esta é uma citação da Regra 8. Esta regra é talvez das mais importantes, o dizer a verdade ao outro e a nós. Os nossos sonhos e objectivos aquando jovens de 18 anos não serão exactamente os mesmos da nossa pessoa aos 50. Aos 18 não sabemos quase nada da vida e, muitas vezes, aos 50 ainda estamos a tentar encontrar-nos. O autor explica isto muito bem: se vivemos de uma forma ingénua, desregrada e manipulada pela sociedade, não crescemos sendo o que verdadeiramente somos. Não nos permitimos pensar, agir e viver a nossa verdade porque vivemos numa posição (muitas vezes narcisista) de apontar o dedo e culpabilizar o governo, o capitalismo, a emigração…tudo! Queremos corrigir o mundo, mas pouco ou nada fazemos para essa transformação acontecer. A maior parte dos ativistas do século XXI são treinadores de bancada sedentos de uma igualdade social mais centrada no seu ego do que propriamente na sociedade em si. Eu não sou muito boa a explicar isto, mas, confiem no Jordan! Deixo-vos com mais uma citação do mesmo capítulo: “O inferno é eterno. Sempre existiu. Existe agora. É o território mais estéril, agonizante e malévolo do submundo do caos, onde as pessoas desiludidas e ressentidas vivem para sempre”.

O livro poderia ser bastante mais curto, achei-o demasiado longo, com demasiadas referências religiosas e cheio de verdades que nos incomodam, porque mudar custa e “se não fôssemos tão estúpidos, não teríamos problemas estúpidos”.

Passo rapidamente para o tema ‘crianças a andar de skate na rua’. Peterson fala da preocupação dos adultos para com estes destemidos acrobatas e resume tudo com “(…) podiam agir de forma mais segura, se usassem os equipamentos de proteção, mas isso estragaria tudo”. Não é a segurança que se quer alcançar aqui; estes jovens querem tornar-se competentes, porque “é a competência que torna as pessoas seguras quando realmente precisam de o ser”.

Ao longo do livro, foram muitos os momentos em que li e reli, mais do que uma vez, determinados parágrafos. Sublinhei e pus post-its tal como fazia nos livros da faculdade. Inúmeras vezes, levantei-me da cama numa salto e li estes parágrafos ao Hugo: “olha esta frase!!” foram palavras que sairam da minha boca muitas vezes durante o mês de janeiro.

Querem alguns exemplos? Só alguns, muito poucos, quase nada. Eu quero que se fascinem a descobrir o livro como eu me rendi e ao qual me entreguei sem preconceitos.

“O que devo fazer com o facto de envelhecer? Substitui o potencial da juventude com as conquistas da maturidade”

“O que devo fazer com o estranho? Convida-o para tua casa e trata-o como um irmão, para que ele se torne, de facto, num irmão”

“O que devo fazer com uma alma caída? Oferece ajuda genuína, mas não te juntes a ela na lama”

Este livro oferece uma ajuda vital para quem quer criar e educar uma pessoa íntegra e amada. Peterson é como um profeta do nosso século, com as respostas mais peculiares e corajosas sempre prontas a serem disparadas de forma derradeira e assertiva. Muito conservador? Bastante. Se concordo cm tudo o que li? Não.

Podemos não acreditar em Deus (eu acredito), podemos não ter religião (eu tenho), podemos não ter crença alguma senão na ciência e no cosmos. Mas estamos todos a navegar no mesmo barco. Uns em primeira classe, outros na zona lúdica perto da piscina e, por inúmeros factores, a maioria está no piso inferior, com a luz apagada e a sofrer.

Como o autor diz, temos de pôr em ordem as coisas que podemos e conseguimos controlar e nunca, mas nunca, deixar de ver o bem. Tem razão, Dr. Jordan, quem perde a capacidade de ver o bem está verdadeiramente perdido.

O que vou eu fazer hoje, agora, para ser um ser humano melhor do que fui ontem? Obrigada pela leitura.

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