Encosto-me comodamente na cadeira. Pego no copo de vinho, cheiro-o, mas ainda não o provo. Olho-o como quem busca conselhos. Que palermice. Volto a encostar-me e inicio a escrita: então cá estamos nós, Joana.

Isto de fazer anos é sempre muito especial. Começar o ano em grande; mudo o ano, mudo a idade; mudo tudo, menos a casmurrice de não aceitar as coisas como elas são. Mas isto são águas de outras marés e, em janeiro, marés é assunto que não me cativa.

Pois não é que os ditados, os provérbios e toda a sabedoria do povo são a verdade mais sincera e imaculada das sapiências. O tempo voa mesmo, a idade é só um número e a vida são dois dias.
Dou comigo a chegar ao fim da meta, a meta dos trintas, e a ultrapassá-la com a calma de quem aceita o destino sem contornos e de mãos vazias, limpas e capazes. Eu quero os quarenta.
Acima de tudo quero libertar-me da pressão que os trintas foram. Tenho de ter casa, não posso morar com a minha mãe, tenho de começar a juntar dinheiro, não posso gastar todo o dinheiro em roupa; e a pior: como assim, não estou casada nem tenho filhos?!
Parecendo que não, os quarenta são uma afirmação de tudo isso. Eu não quero ter filhos, eu quero gastar o meu dinheiro em roupa e quero levar a vida como levava aos dezassete; “louca, linda, leve e solta”. Se sou uma insensata, sou. E chega de pleonasmos, pois já o assumi neste parágrafo.

Eu gosto disto. Gosto da minha vida, de viver o dia, todos os dias singularmente e descobrir-me e perder-me neles. Se isto significar ser uma eterna sonhadora, incapaz de assumir as rédeas de uma vida de adulta convencional, que o seja. Sempre fui anarquista de coração, porque não sê-lo em postura e comportamento?

Os quarenta são, para mim, a libertação da pressão social. São a minha afirmação enquanto mulher jovem e capaz num mundo em constante evolução. E, repito, jovem, porque 40 não são 80 e, com saúde, só a alma tem verdadeiro peso. E a minha não carrega fantasmas nem remorsos.

Entro nos quarenta feliz. Sinto-me abençoada e radiante. Quanto mais quero escrever o que de bom sinto, mais medo tenho que se venha a agourar tudo e se derrame toda a felicidade num charco triste de lágrimas e aflição.

Toquem os sinos, batam as palmas, cantem e gritem o meu nome. O meu dia é o melhor dos dias e eu sou a mais sortuda.

A sério, não tenham medo da idade, não tenham medo disto, de acrescentar números à nossa pessoa. O que são números? Matemática!! E como eu sempre a detestei.
Não tenham medo das marcas que os anos nos deixam no corpo, elas carregam a experiência e as vivências de que somos feitos. Não tenham medo de olhares estranhos e preconceituosos. Que me importa a mim o que pensam? Os que nos amam, amam numa cama de hospital inválidos e sem expectativas. Os que não nos amam, merda para todos eles. Com a força toda! Para a merda! Desamparem-me a loja, que ela é pequena e de qualidade. Os clientes que nela entram são escolhidos a dedo e o tempo escasseia.

O ficarmos menos novos dá-nos isto; este despeito, senão mesmo desprezo, pelo que pouco ou nada importa. Vivo em ousadia e confiança. Faculdades que tanto precisava nos doces 20s. Vivo e isso é o princípio e o fim de tudo. Eu vivo e sinto, e Deuses, como eu me sinto grata!! Venham 40; encham-me de virtude, amor e alienação mental. O mundo é dos loucos e é lá que eu pertenço.

Parabéns a mim!!!

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