Não sei se começou com a escola, com a televisão e os filmes ou com o simples acto de existir, mas sei que houve uma altura em que me apercebi que não queria, e não vestia, o que a minha mãe me dizia, mas sim o que me apetecia. Estamos a falar de tempos muito remotos, estamos a falar de uma idade demasiado tenra para associar a escolha da roupa a uma afirmação social. Mais tarde, já no primeiro ciclo e, especialmente, no liceu, sei que a roupa escolhida e vestida era consequente do que sentia. Como que uma necessidade fisiológica mais forte do que eu, uma auto-afirmação evidente e vital.

No liceu, na adolescência, vestimos os sentimentos porque precisamos de nos validar, nos encontrar e afirmar. Precisamos de partilhar com o mundo o que somos e do que somos feitos. Não podemos correr o risco de passar a imagem errada. A nossa gravura é a nossa essência, e nela estão retratados todos os traços que preenchem a nossa personalidade. Sejamos rebeldes, anarquistas, ambientalistas… Tudo entra na nossa ilustração. Contudo, e pessoalmente, foi na música que encontrei os alicerces mais fundos, mais vivos e sólidos. Não somos todos nós fruto da música que ouvimos, crescemos a ouvir e chorámos a cantá-la? Por certo, estas palavras fazem ressonância em muitas de nós. A música é transversal a culturas, etnias e crenças. Acompanha festas, une países e desperta paixão, dor, vida, emoção.
Encontramos na música um porto de abrigo e um espelho da nossa alma. A música encanta-nos e liberta-nos. Temos com ela uma mistura de plenitude, prazer e salvação.

Tive a sorte de ter um pai entusiasta de música de culto. Cresci a ouvir os monstros do rock, do pop, do blues e do soul. Foi no rock que o meu esquiço se tornou em desenho. O rock alimenta-me e dá-me força. Ao ouvir rock, é sempre primavera, somos sempre jovens e o vigor é infinito.

Vestir-me de acordo com o que ouvia validava-me enquanto menina mulher num mundo cão. Porque por mais privilegiados que possamos aparentar ser, o conflito interno (tão mencionado no meu post anterior) tem a voz mais alta de todas.
É engraçado aperceber-me de que já não consigo vestir-me ou reconhecer-me no registo grunge. Embora o meu coração grite rock, o espelho pede-me quietude e é neste balanço entre os dois que encontro o meu equilíbrio.

Já não preciso de preto para me sentir rebelde. Sou rebelde porque sou uma eterna e incansável sonhadora.
Já não preciso de estar vestida de forma alguma para ter validação. Enquanto mulher, é a minha postura que me revela. E eu sou tudo o que quero ser, em azul bebé, roxo ou castanho.
A roupa cresceu comigo e, juntas, florescemos cisnes num lago azul, por entre montes e árvores. É que agora eu vivo na natureza e, tal como o rock, também ela é dura, crua e sincera.

Camisa e Calças Topshop/ Blazer Wheat & Rose/ Galochas Lemon Jelly